sexta-feira, 18 de março de 2011

SOS Professor.

Sento à minha mesa, são15:00 h.
Estou sem forças e sem motivação nenhuma para pedir para dar aulas. Sim, eu tenho que pedir, por favor, e pelo amor de Deus pra dar aulas, se quiser fazê-lo. Eu teria que levantar gritar, pedir silêncio, gritar, mandar sentar, me aborrecer, gritar, tirar alguém de sala… Só assim teria o mínimo do mínimo para fazer qualquer coisa.
Mas não tenho motivação nem vontade de me aborrecer pra dar aulas.
Eles continuam, às quinze horas e dez minutos , absolutamente como se eu não estivesse aqui.
Neste momento têm seis alunos em pé.
Há uns vinte falando ao mesmo tempo e, como não se ouvem, falam mais e mais alto.
Um deles batuca com a bala halls na mesa, cantando um funk.
Outros três olham pela janela.
Outro grita palavras de baixo calão para a colega.
Outros dois dormem, de cabeça baixa.
Folhas são arrancadas e jogadas displicentemente para frente, em direção à lixeira, sem acertá-la. Mas não as pegam, ficam no chão. Ao menos é um avanço: não estão jogando-as, agora, nos outros.
Uma aluna grita pela janela, falando com alguém na rua.
Outra joga um pedaço de plástico pela janela.
São 15:30. É como se eu não estivesse aqui.
Um faz um sinal feio para o colega de fora da sala.
Outro me pede “Professor, não dá aula hoje não!” – como se precisasse pedir…
Agora há somente uns dez falando ao mesmo tempo.
Uns seis chupam pirulito, cujos papéis de embrulho e palitinhos vão para o chão, invariavelmente.
No início da aula havia um aluno com uma bolinha de papel na mão, jogando–a para o alto e pegando-a novamente. Para evitar um míssel, pedi a bolinha e joguei-a no lixo. Agora ele está com outra, fazendo o mesmo.
Contei trinta crianças em ebulição em sala.
Eles não têm vontade.
Eu tenho uma sala de trinta metros quadrados com quarenta e cinco carteiras carteiras, trinta alunos, o meu livro de professor e um quadro.
A janela da sala dá pra frente da rua, onde passam caminhões barulhentos e onde há pessoas que mexem com os de dentro e eles mexem com os de fora.
Estou só aqui dentro.
Daniel na cova dos leões.
Me levanto e grito pra fazer silêncio?
Mesmo que fizesse, silêncio mesmo não haverá, por conta do barulho da rua.
Me levanto e digo que estou aqui? Não… acho que eles sabem.
Tento “dar aula”?
Antes de eu tentar levantar, ouço um CARALHOOOOO! bem alto, vindo do meio da sala.
Desisto de tentar dizer a eles qur preciso dar a aula.Um joga água na colega. A colega revida.
Mais bolas voam ao chão.
Uma aluna dá chutes em outro aluno.
Um aluno “rouba” o caderno de outra, que sai correndo para pegar, passando por cima de mais um.
São quinze horas e trinta minutos e têm doze alunos em pé, em uma sala de trinta metros quadrados contendo trinta alunos alunos.
Falam alto, gritam pela janela, batem uns nos outros, gritam, jogam bolinhas de papel, dão socos e recebem tapas, dão puxões de cabelos nas meninas, fazem queda-de-braço, batucam nas carteiras.
Eu penso que, com estas condições, nunca atingirei o índice que nossa santidade a secretária quer que atinjamos para nos “PREMIAR”.
De qualquer forma, eu não ganharei mesmo, por conta do problema de saúde que tive no início do ano – por conta desta mesma escola. Então...desisto de dar aulas........
Estas são as condições que vivenciam diariamente diversos professores da rede pública, e o que os pais, os governantes, enfim, a justiça pensa fazer para ajudar esta classe que está tão desanimada com tudo? O que você faria?

Um comentário:

  1. Este é o depoimento da situação em que vivencia uma amiga.
    Penso que, antes de qualquer coisa, é preciso que o profissional esteja ciente da comunidade em que está inserido e procure conhecer as principais razões dessa violência. Outra observação importante é que muitas vezes encontra-se a solução para os problemas alheios e sequer tem-se a consciência de que o problema pode estar no próprio profissional, devido ao acúmulo de trabalho, estresse, insatisfação, perdas salariais etc...entretanto quando ele consegue se dar conta disso, não que os problemas estejam todos resolvidos, mas cria-se a possibilidade de amenizar o fardo do aluno.
    Então...o que fazer para reduzir a violência nas escolas? Processo de humanização. Em cada aula entregar ao aluno algo diferente do que ele traz de casa ou da rua. Dar a ele a possibilidade perceber que ali alguém o vê como gente, como um ser em formação, que alguém ainda espera algo dele. Isso é bastante difícil, sei muito bem disso. Sempre tive um discurso que aplico até hoje em sala de aula. Todas as vezes que preparava algo para durar cerca de 40 minutos e não tinha um diálogo com a turma, a aula virava um fiasco e eu me sentia quase incompetente. Então comecei a apostar na sensibilização, no envolvimento, e até mesmo na combinação de dar um tempo para que os alunos respirassem, mas sabendo que a aula ia acontecer de um jeito ou de outro. O que pude observar é que o tempo que gasto fazendo isso, acaba sendo recompensado pelo retorno que me dão em atenção e participação nas aulas.
    Isso é uma receita? Resolve tudo? Certamente que não, é um trabalho contínuo. Muitas vezes a preocupação com o conteúdo faz com que os professores entrem ávidos em suas turmas mas, ao saírem, mostram-se tão decepcionados que nem sentem vontade de retornar na aula seguinte. Investir sempre na socialização, bate papo, dinâmicas e atividades lúdicas que quebrem a dureza do dia a dia. E, acima de tudo, contar sempre com a ajuda de Deus!

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